Em crônica intitulada “persona”, Clarice Lispector escreve que viver é fabricar a própria máscara (persona) e escolhê-la é o primeiro gesto voluntário humano. Trata-se de gesto solitário e amedrontador, mas que, uma vez performado concede ao corpo uma nova firmeza em que “a cabeça se ergue altiva como a de quem superou um obstáculo. A pessoa é.” Pensar sobre estas palavras pode iluminar a compreensão da obra da escritora, pois, o sentido de a pessoa ser o que é, pode ser interpretado como realização da liberdade que se destina ao ser humano. Essa realização, certamente, pressupõe uma travessia que traduz uma procura por apossar-se, apreender aprendendo-se a si próprio e é, justamente, esse o esforço que se observa ao longo da ficção de Clarice Lispector. Sobretudo em seus três últimos romances, o teatro da vida/linguagem desdobra e explicita a questão que, desde sempre, se apresentava no cerne da escritura Clariceana, mas que, por outro lado, era apenas dissimulada como uma espécie de pano de fundo para o enredo nos romances anteriores, e que, a partir de então, será o próprio espaço de realização da linguagem enquanto linguagem: a arte.